E quem me dera que o meu tivesse sido.
Lembro-me que um dos meus pensamentos, no auge da dor e antes de me levarem para o bloco operatório, foi: "Desisto!"
Claro que no milésimo de segundo seguinte percebi que não havia cá "desisto" para ninguém. Era uma situação da qual é impossível escapar. O bebé tem de sair, doa o que doer, saia como saia.
No artigo "O Meu Parto III - O Parto", fiquei aqui:
Como ela tinha nascido de manhã, assim que fosse para a enfermaria poderia receber visitas.
Durante todo este tempo, desde que tinha saído da sala de partos, o Duarte ficou quase 2 horas sem saber de mim. Quando, finalmente, encontrou uma médica que tinha estado no nosso quarto foi-lhe dito que "mãe e filha estão bem". Foi assim que ficou a saber que já era pai. Quando saíssemos do recobro ele poderia ver-nos.
O que não sabíamos é que haveria uma falha informática e, durante um período de tempo, ninguém saberia responder à pergunta do Duarte "Onde estão a minha mulher e a minha filha?".
Continuando...
Até chegar ao recobro estava meio abananada. Já sem dores, a tentar perceber o que se passava, quem era, a tentar perceber o que tinha acontecido nas últimas horas e com um cansaço enorme.
Pensei no bem que me saberia dormir umas valentes horas. Uma boa noite de sono, que já não tinha há dias. E depois lembrei-me que isso tudo tinha acabado. Não havia cá descanso. Não haveria noite de sono bem dormida, nem de várias horas seguidas.
Agora tinha uma bebé e a recuperação e descanso tinham de ser feitos de acordo com ela.
Da parte da bebé, enquanto estive na maternidade, não me podia queixar. Todos os outros bebés choravam, a minha nem emitia um som. Aliás, a minha grande preocupação em relação a ela era que não acordava nem por nada. "Deve mamar de 2 em 2, 3 em 3 horas", diziam e uma hora era passada a tentar fazer com que acordasse. Nas primeiras semanas mamou sempre nua, só de fralda. Despiamo-la para que acordasse e às vezes isso não era suficiente e tinha de ser combinado com cócegas nos pés ou nas axilas e estimulação do maxilar, porque ela adormecia durante a mamada.
Pegar bem na mama, é toda uma outra história, todo um outro artigo. Porque, ao contrário do sono, não foi nada fácil. Agora começa a melhorar, e mesmo assim...
Chegada ao recobro, foi-me dito que, assim que passasse para a enfermaria poderia receber visitas. Pouco tempo depois, a enfermeira apareceu e disse-me que iam abrir uma excepção à regra de "não visitas no recobro", porque o sistema informático estava em baixo e não me conseguiam transferir para a enfermaria. Só o pai da bebé poderia vir e já era uma excepção enorme. Alguns minutos depois:
"Vem aí o pai e o avô". "O avô? Qual avô? Não me sabe dizer?". Não me apetecia nada que o pai do Duarte aparecesse, não me sentia com forças para formalismos. "O avô que é médico." Era o meu pai! Fiquei tão feliz! Estava explicada a segunda excepção. Se o meu pai não fosse médico, não teria entrado. Mas é assim que as coisas funcionam. E, se eu sempre fui muito inibida dessas coisas e raramente usei "o meu pai é médico" em contextos que me poderiam ajudar, naquele momento não queria saber. Sim, é um privilégio. Não, não quero saber se é certo ou errado. Estava fragilizada e ter o meu pai ao lado era o que eu precisava.
Chegaram ao recobro, só podiam ficar 5 minutos, porque não é suposto haver visitas naquele local. A felicidade nos olhos de ambos, a conhecerem a Carminho. O meu pai sacou logo da máquina e ele e o Duarte tiraram fotos à e com a bebé, ao mesmo tempo que me davam atenção a mim também.
Veio a enfermeira e disse-lhes que o avô tinha de sair, mas o pai ainda podia ficar mais um minutinho. Quando chegou a altura de sair, ficou combinado que eu lhe ligaria quando passasse para a enfermaria. Pouco depois, a enfermeira viu-me com o telemóvel e disse-me que não o podia ter no recobro. Já não me lembro bem porquê, mas o Duarte voltou ao recobro e tive de lhe entregar tudo, ficando incomunicável.
Entretanto, tive vontade de fazer xixi. Trazem-me uma arrastadeira e, tal como durante o parto, tive de ser algaliada. Não adiantou endireitarem as costas da cama ou saírem de perto da cama. Não havia maneira de fazer xixi, portanto foi de algália. Duas vezes. Numa das vezes acho que fiz o xixi mais longo da minha vida. Nunca pensei que algália fosse tão simples e pensava que se ficava sempre com uma sensação de xixi incompleto, mas não. É impecável. Não dá aquele alívio que sabe super bem, mas ficamos óptimas.
Ora, as visitas na MAC para os pais são das 12h às 21h. A Carminho nasceu às 10h56 e só passei para a enfermaria pelas 18h00.
Estava eu a "arrumar" o meu espacinho na enfermaria (temos uma cama, uma mesa de cabeceira, o berço e nada mais), quando:
- Tia? Olá! Já passou a hora das visitas, com é que... oh! Já sei! Já percebi - A minha tia é enfermeira e, tal como o meu pai, fez uso da chamada "cortesia profissional".
Antes que comecem já a fumegar e a dizer que estas excepções são inadmissíveis deixem-me dizer que a "cortesia profissional" e o "favor ao amigo" funcionam em qualquer profissão. Quem conhecer gente nas Finanças ou na Segurança Social, nem sequer tem de lá pôr os pés, os amigos levam-lhes os papéis e ajudam-nos nessas coisas. Nos bancos é a mesma coisa, nas imobiliárias também, nas forças policiais, na EMEL. Lojistas que usam os seus descontos para comprar coisas para os amigos, etc, etc, etc... É assim em todo o lado. E não me venham dizer que, se fossem vocês, não aproveitariam a excepção. Além do mais, eu estive "presa" no recobro durante horas, logo a seguir ao parto, em que não podia ver ninguém, em que não pude contactar ninguém, por causa de uma situação excepcional.
Aproveitei que a minha Tia estava ali para ir à casa de banho. Assim, a Carminho não ficava sozinha. Levantei-me, comecei a arrastar-me pela enfermaria e só depois de alguns passos é que reparei que estava a deixar um rasto de sangue atrás de mim. A porcaria da cueca e do penso gigantes, tinham saído do sítio e eu estava a sujar tudo. Por isso é que vos digo: fraldas para adultos! Com as fraldas isto não teria acontecido.
O meu "xixi tímido" não é só para o uso de arrastadeiras, é também em casas de banho públicas. Além do mais, com a episiotomia acontece as mulheres sentirem um ardor (mais ou menos intenso, depende da mulher) quando a urina entra em contacto com a ferida. A antecipação dessa dor fazia com que o xixi ficasse ainda mais tímido. Respirei fundo, concentrei-me, e fiz o que tinha a fazer. Não me doeu, não me ardeu, nada. Pelo menos dessa tinha escapado. Custava-me imenso andar, por causa da cicatriz. Para me limpar só mesmo a encostar o papel, nada de o arrastar na pele.
Pedi à minha Tia que ligasse à minha mãe, para que ela dissesse ao Duarte que eu já estava na enfermaria e para ele me trazer o telemóvel e as minhas coisas. Porque eu não tinha nada. Nem mala, nem artigos de higiene, nada! Só me tinham deixado ficar com uma muda de roupa para a bebé. A resposta do meu querido marido foi que já não pensava em passar lá naquele dia e que me levaria as coisas no dia seguinte. Fiquei num misto de incrédula, com desapontada, com triste, com furiosa, com sensação de ter sido abandonada. Sabem a que distância nós moramos da maternidade? 2 quilómetros! Até a pé se faz num instante! Não só a filha dele tinha acabado de nascer, o que era argumento suficiente para ele dever querer voltar à maternidade, como sabia que eu nunca tinha sido internada e que estava sozinha e sem comunicação com os outros. Como é que ele podia ter uma atitude daquelas? Estar com os amigos a celebrar a paternidade era mais importante do que cumprir o seu papel de pai e de marido? E o que é que custava interromper a festa durante 10 minutos para me ir levar as coisas? A certa altura eu já só estava furiosa.
Sentar-me, deitar-me, levantar-me, tudo era um suplício com as dores que tinha na cicatriz. Quando serviram o jantar, debiquei qualquer coisa, sempre em pé, porque só de olhar para aquela cadeira de metal me doía a cicatriz.
Chegou a altura de apagarem as luzes da enfermaria. A bebé a ter de mamar de 2 em 2/3 em 3 horas e eu sem relógio ou telemóvel para poder ver as horas. O único relógio da enfermaria não era visível da minha cama e a solução que a enfermeira me deu foi levantar-me e ver ou então pedir a uma das outras mães. Amaldiçoei o Duarte. A minha bebé era dorminhoca, era dificílimo acordá-la para lhe dar mama, eu com medo de que ela entrasse em hipoglicémia pela falta de alimentação e sem forma de poder controlar as horas sem ser levantar-me, o que me fazia doer a cicatriz só de pensar. Estava eu a resignar-me ao meu destino de mais uma noite terrível (já tinham sido duas noites em claro, mais uma que mal faria? "Assim é que se vê que só podemos contar com nós mesmos. Não vale a pena contar com a ajuda dos outros. Sou eu e tu filha, só as duas e vamos conquistar o mundo!"), quando o Duarte entra na enfermaria.
Vá lá! Dignou-se a interromper a festa de "wee sou pai" para ser pai e marido. Não sei, nem me interessa, porque é que mudou de ideias, mas agora eu já podia por o alarme para 3 em 3 horas e tentar dormir nos intervalos.
De 3 em 3 horas, fazia um esforço "sobre-humano" para me levantar e acordar a bebé para lhe dar mama. E depois, um segundo esforço para dar a segunda mama e ter de me virar na cama enquanto a segurava. Tinha de a despir e fazer cócegas e todo um número de ginástica para que ela acordasse e mamasse. Tenho a sensação que chamava as enfermeiras sempre que era hora da mama, porque ela não acordava e eu tinha medo de ser muito brusca a acordá-la.
A certa altura, uma das enfermeiras reparou que eu estava a ficar com feridas nos mamilos. Não me doíam, mas estavam lá. A Miminho não pegava bem e estava-me a ferir os mamilos. Sugeriram que usasse um mamilo de silicone. Lá foi o Duarte levar-me um mamilo de silicone e placas de gel da Medela.
Confesso que nem me lembro bem do tempo que lá estive.
Lembro-me que as enfermeiras e as auxiliares era todas, todas!, amorosas e super pacientes e profissionais. Em particular a Enfermeira Graça Lima, com quem criei uma ligação mais especial.
Lembro-me da inter-ajuda entre mães, quando alguma de nós precisava de ir à casa de banho: "podes só vigiar aqui o meu bebé?".
Lembro-me de como uma mãe se riu quando viu a minha cara a olhar para a cadeira à hora do almoço: "sei bem o que estás a pensar. Custa bastante". E ficámos a trocar impressões sobre as dores.
Lembro-me que de 4 em 4 horas lá tomava um paracetamol.
Lembro-me que passava a vida a pedir gelo para a episiotomia.
Constantemente, lá estava eu a carregar no botãozinho para pedir ajuda a alguém.
Só lá estive dois dias, mas pareceu imenso tempo. A certa altura, apesar de toda a ajuda, só já queria ir para casa. Ir à casa de banho enjoava-me imenso. Era o cheiro. O cheiro a sangue, o cheiro a fluidos. Não era o cheiro a xixi e cocó, era o cheiro dos lóquios. Já não podia com aquele cheiro.
No último dia iam pesar a bebé, ver da icterícia, etc., para saber se lhe davam alta, e depois viria uma médica observar-me para ver se me davam alta.
Foi a Enfermeira Graça que a pesou e reparou no angioma na nuca da Carminho - "É a marca dos especiais!" disse-me ela, mostrando-me o seu. Contra as expectativas das enfermeiras (aparentemente, tinham falado sobre isso) a bebé já tinha recuperado peso suficiente para poder ter alta e de resto estava tudo bem com ela. Pois é, a minha filha não queria acordar para mamar, mas quando pegava na mama era a sério.
Comigo, estava a recuperar bem da episiotomia e estava tudo bem, mas tinha de ir à casa de banho. Oh não!!
Se eu tenho xixi tímido, com o resto ainda é pior. Expliquei à médica e à enfermeira o meu dilema. "Eu sofro de obstipação e não consigo ir à casa de banho em locais públicos. Não consigo relaxar. Em casa tenho um banquinho para apoiar os pés e todas essas coisas. Ainda há umas semanas tive uma crise, fiz um clister e nem assim me aliviei. Tive de tomar dois clisteres e aguentar 15 minutos num banho de imersão morninho. Eu duvido que vá conseguir fazer aqui. Há sempre gente a entrar e a sair da casa de banho, sons, não consigo relaxar a pensar que pode ser a minha bebé a chorar...". Elas entenderam o meu problema. "O ideal era que fizesse aqui, mas compreendemos isso".
Naquele dia a Enfermeira Graça, que era uma porreiraça, tentou, sem sucesso, encontrar uma casa de banho mais sossegada, e perguntou-me se eu queria um clister para tentar ir à casa de banho, "é melhor serem dois". Pus-me a andar de um lado para o outro e a aguentar o máximo de tempo possível. Quando tive vontade fui para a casa de banho. E o que é que saiu? Nada!! Só o próprio clister. Foi uma desilusão. Até ela ficou surpreendida. Passadas umas horas, diz-me que me iam dar alta, mesmo sem ter ido à casa de banho, reforçou que o ideal seria fazer ali, mas que se não fizesse ia para casa na mesma. Disse-lhe que tentaria uma segunda vez. Mais dois clisteres. "A ver se é desta". Mais quinze minutos. Mais uma ida à casa de banho. Finalmente!!! Consegui fazer. Saí da casa de banho, encontrei a enfermeira:
- Consegui!!!! - E abraçámo-nos a festejar e a rir.
Antes de sair, esteve a explicar-me uma data de procedimentos e contraceptivos e tudo e tudo. "Contraceptivo? Abstinência e não se fala mais nisso!", disse eu. Depois daquilo tudo quem é que pensa em sexo? Quem é que, 48 horas após ter sido cortada e levado pontos internos e externos pensa em ter algo a roçar ali? Ok! Eu sei que há mulheres que pensam. Acho óptimo, saudável, tudo isso. Acho também que são umas bravas do caraças! Porque só de pensar em lavar-me naquela zona ficava toda encolhidinha. E só de pensar noutro parto ainda mais!
- Depois pensamos no segundo - disse o Duarte
- Tu pensas no que tu quiseres e podes ter quantos quiseres. Eu fechei a loja. Podemos adoptar, recorrer a uma barriga de aluguer... podes ter filhos com outra... como quiseres. Eu nem quero ouvir falar nisso.
Enfermeira Graça, se ler este artigo (eu sei que segue o blogue), um grande abraço para si e para todas as enfermeiras que, infelizmente, não decorei o nome. Mas em especial para si ❤
A saída da Maternidade revelou o alto nível de segurança com que os nossos bebés estão protegidos. Não só o alarme no pézinho, como vários pontos de controlo que comunicavam uns com os outros à nossa passagem. E, mais uma vez, todos uma simpatia.
Ainda estava na zona da enfermaria quando passámos pela das adolescentes. Acho eu que eram adolescentes, eram super novinhas. Estavam duas à porta, ainda grávidas, que olharam para a minha bebé e disseram "ooohhh, tão fofa! Tão linda! Tão pequenina!" e eu a babar-me, para logo a seguir uma delas me dizer "uau! Ainda tem uma barriga tão grande!!", "Então, é normal, a seguir ao parto a barriga não desaparece logo", "olha - disse-me a miúda - do meu primeiro, no dia a seguir estava lisinha". "Bitch!!", pensei eu... Se calhar com menos 15 anos a minha barriga também desapareceria no dia a seguir, mas a idade não perdoa... Sacana da miúda, logo a lembrar-me que tinha um longo caminho de recuperação a percorrer. Mas pronto, apesar de brutinha era simpática. Mas bolas, adolescente e já no segundo filho?
A viagem até casa foi um suplício. Aliás, sair da MAC foi um suplício. Bem como as três semanas seguintes.
Andar era um horror, sentar o terror... Até mudar de lado quando estava deitada era doloroso.
A acrescentar, tinha de sair de casa para ir ter com a minha tia ao Estoril para ir ver as minhas mamas (a amamentação foi um processo muito complicado e que, só agora, começa a melhorar), tinha de levar a miúda à pediatra.
Sou ateia, mas quando tinha de sair de casa benzia-me e rezava. Não, não o fazia. Mas quase!
Durante a primeira semana em casa estava cheia de medo. De tudo! Até da minha bebé.
E se faço as coisas mal? Ao mesmo tempo, um enorme sentimento de frustração, porque não lhe conseguia dar colo. Dava-lhe mama deitada, porque era a única posição em que aguentava as dores, e tudo o resto tinha de ser o Duarte.
Tinha de ser o Duarte a tirá-la do berço para ma trazer, tinha de ser o Duarte a mudar as fraldas e a limpá-la, tinha de ser o Duarte a dar-lhe colo. E eu ali, deitada, impotente. A única coisa que podia fazer era dar mama e esse era um filme de terror.
Chorei imenso. Não só pelas dores, mas pelo perceber que o momento da amamentação não estava a ser o momento de vinculação que eu tinha esperado. Antes pelo contrário, era um momento horrível, de tensão, de stress, de medo, de dor, de angústia. Cada vez que ela começava a pedir mama eu quase tremia. Lembro-me de chorar ao lado do berço e pedir desculpa à minha bebé, por não conseguir ser uma melhor mãe. Por não conseguir pegar nela quando ela precisava de conforto e por não conseguir que o momento da mama fosse um momento de vinculação.
Andar era um horror, sentar o terror... Até mudar de lado quando estava deitada era doloroso.
A acrescentar, tinha de sair de casa para ir ter com a minha tia ao Estoril para ir ver as minhas mamas (a amamentação foi um processo muito complicado e que, só agora, começa a melhorar), tinha de levar a miúda à pediatra.
Sou ateia, mas quando tinha de sair de casa benzia-me e rezava. Não, não o fazia. Mas quase!
Fonte |
E se faço as coisas mal? Ao mesmo tempo, um enorme sentimento de frustração, porque não lhe conseguia dar colo. Dava-lhe mama deitada, porque era a única posição em que aguentava as dores, e tudo o resto tinha de ser o Duarte.
Tinha de ser o Duarte a tirá-la do berço para ma trazer, tinha de ser o Duarte a mudar as fraldas e a limpá-la, tinha de ser o Duarte a dar-lhe colo. E eu ali, deitada, impotente. A única coisa que podia fazer era dar mama e esse era um filme de terror.
Chorei imenso. Não só pelas dores, mas pelo perceber que o momento da amamentação não estava a ser o momento de vinculação que eu tinha esperado. Antes pelo contrário, era um momento horrível, de tensão, de stress, de medo, de dor, de angústia. Cada vez que ela começava a pedir mama eu quase tremia. Lembro-me de chorar ao lado do berço e pedir desculpa à minha bebé, por não conseguir ser uma melhor mãe. Por não conseguir pegar nela quando ela precisava de conforto e por não conseguir que o momento da mama fosse um momento de vinculação.
Chorei, gritei, mordi-me, contorci-me, apertei o Duarte, tudo e mais alguma coisa enquanto dei mama. E só pensava: vou aguentar 1 mês. Como esse mês custou a passar. No fim, "só mais outro mês". E assim chegámos aos 3 meses, sem que ela conhecesse outra fonte de alimento que não a mama.
Mas o tema da amamentação deixarei para outro artigo.
Mas o tema da amamentação deixarei para outro artigo.
Tinha todos os cuidados com a episiotomia: arranjei uns paninhos de microfibra (ou melhor, cortei uma daquelas toalhas da Decathlon em vários paninhos) e, sempre que ia à casa de banho, lavava com água fria e sabão neutro (glicerina), depois limpava-me com o paninho. Só encostando, para absorver a água e secar o mais possível, nunca arrastando o pano.
Tirava fotos à cicatriz todos os dias, para ir vendo a evolução. Até que um dia, reparei e confirmei, um ponto infectado.
Claro... Claro que eu tinha de ter um ponto infectado! Porque é que haveria de ter uma cicatrização simples e rápida? Naaaaa.... Tinha de me infectar um ponto.
Mais uma ida às urgências. Horrível. Eu sem experiência a dar mama, só tinha dado deitada, e ali à espera só para me verem um ponto. A certa altura perguntei se não tinham um sítio mais recatado do que a sala de espera, para poder dar mama. Deixaram-me entrar. Mas mesmo assim, as cadeiras não eram confortáveis até por causa das dores horríveis, e o Duarte não podia estar lá dentro por causa das outras mulheres. Já tinha leite a esguichar por todos os lados e disse, com lágrimas nos olhos, "vou-me embora. Não vou ficar mais tempo aqui à espera, por uma coisa que só demora 5 minutos. A minha bebé precisa de mamar, eu não consigo dar aqui, vou-me embora".
As enfermeiras e médicas repararam e fui atendida logo a seguir. 2 minutos depois, saía do gabinete com uma receita de uma pomada para aplicar na cicatriz.
Durante duas semanas, a minha rotina diária consistia numa eternidade sempre que ia à casa de banho. Nunca me limpava com papel higiénico, só o encostava para absorver o excesso que ficava na pele e depois era "lavar com água fria, sabão neutro e passar com uma toalha suave", de seguida um quantidade enorme de cicalfate na cicatriz.
Para além da cicatriz tinha ainda de cuidar da hemorroidal. Claro que tinha de ter ficado com aquilo... Por isso, para além daquela rotina para a cicatriz, tinha ainda um bónus 3x ao dia de pomada para a hemorroidal.
A certa altura já nem sabia o que me doía mais: a cicatriz ou as hemorróidas.
Não só fazia estas limpezas todas como comecei também a fazer os Kegel. E com eles senti uma melhoria enorme, em tudo.
3 semanas depois do parto já estava quase como nova e decidi começar com caminhadas diárias. O que não durou muito tempo, porque veio uma onda de calor enorme e só ficava uma temperatura agradável às 22h00 e a essa hora não levava a miúda para a rua.
Quando tudo estava a encarrilar: menos dores, a amamentação menos mal, já conseguia andar, já não sangrava... O Duarte é operado ao tendão de Aquiles e tudo nesta casa cai em cima de mim.
"Tens de descansar", "Dorme quando ela dorme", "Tens de tratar de ti". Como? Impossível, entre um bebé recém-nascido e um marido que não pode andar, quem tinha de tratar da casa era eu. Quem tinha de acartar com as tralhas todas da bebé sempre que saíamos de casa era eu.
O cansaço já era tanto que chegou a um ponto em que eu já cometia erros parvos a conduzir. Não eram perigosos, eram erros de não me conseguir lembrar de caminhos que fazia há anos, de demorar eternidades a estacionar.
O que me valia é que a nossa bebé é uma santa. Tirando o não pegar bem na mama, não dá trabalho nenhum: dorme bem, alimenta-se em boas quantidades, não tem cólicas, é bem disposta.
Pronto: sofri com tudo, mas se a recompensa é ter uma sorte enorme na bebé que tenho e ela ser super saudável e feliz, isso vale a pena.
Oiço histórias de amigas e de mães em fóruns a dizer que os bebés não dormem, que acordam de hora a hora, que perdem peso, que têm cólicas. E eu sou penso "abençoada filha que me calhou."
Vale a pena todos os horrores do parto, dos pontos infectados, de todos os problemas nas mamas (feridas, bolhas, mastites, pus, etc etc), se tenho uma bebé que não sofre. Que é amada, que é feliz, que é saudável, que se está a desenvolver muito bem, que adere rapidamente às rotinas, que dorme...
Por ela, tudo vale a pena. Porque ela é a minha prioridade. Porque o meu dever enquanto mãe é protegê-la, adaptar-me às suas necessidades (por enquanto...), tudo.
A vinculação aconteceu. Não foi imediata, não foi com a amamentação (de todo!), foi com o cuidar dela. Foi com o brincar, com o limpar, com o falar. Foi com o dar colinho quando ela chora (não chora muito, mas chora). Foi com o perceber que ela me procura quando está com outras pessoas ou a brincar sozinha, mesmo que a seguir dirija a sua atenção para outra coisa. Foi com os sorrisos com que ela me presenteia todos os dias. Então os do acordar, são maravilhosos. Foi com o perceber que não há colo como o da mãe. Se ela começa a resmungar ou a chorar, mal vem para os meus braços tranquiliza. São os bracinhos dela à volta do meu pescoço a agarrar com força para que eu não a largue.
Todos os dias o amor cresce mais um bocadinho. Não veio com o parto, foi sendo construído. Não foi automático, mas já me apercebi que daria a minha vida por ela sem pensar. Agora já é o amor incondicional. É o amor da minha vida e agora percebo muitas coisas que dantes não percebia. Mas isso já é tema para outro artigo.
Agora que a minha história da gravidez e do parto está concluída, a minha ideia é ir partilhando convosco coisas como a linguagem dos bebés (sinais que eles dão de que estão com fome, sono, sobre-estimulados ou pouco estimulados), as sestas, o brincar, a importância das rotinas, como os habituar a adormecer/tranquilizar sozinhos, a amamentação, etc. Quero escrever também sobre a questão da vinculação, da amamentação, da depressão, etc.
Se houver algum assunto sobre o qual gostavam de ler, é só dizerem.
Tirava fotos à cicatriz todos os dias, para ir vendo a evolução. Até que um dia, reparei e confirmei, um ponto infectado.
Claro... Claro que eu tinha de ter um ponto infectado! Porque é que haveria de ter uma cicatrização simples e rápida? Naaaaa.... Tinha de me infectar um ponto.
Mais uma ida às urgências. Horrível. Eu sem experiência a dar mama, só tinha dado deitada, e ali à espera só para me verem um ponto. A certa altura perguntei se não tinham um sítio mais recatado do que a sala de espera, para poder dar mama. Deixaram-me entrar. Mas mesmo assim, as cadeiras não eram confortáveis até por causa das dores horríveis, e o Duarte não podia estar lá dentro por causa das outras mulheres. Já tinha leite a esguichar por todos os lados e disse, com lágrimas nos olhos, "vou-me embora. Não vou ficar mais tempo aqui à espera, por uma coisa que só demora 5 minutos. A minha bebé precisa de mamar, eu não consigo dar aqui, vou-me embora".
As enfermeiras e médicas repararam e fui atendida logo a seguir. 2 minutos depois, saía do gabinete com uma receita de uma pomada para aplicar na cicatriz.
Durante duas semanas, a minha rotina diária consistia numa eternidade sempre que ia à casa de banho. Nunca me limpava com papel higiénico, só o encostava para absorver o excesso que ficava na pele e depois era "lavar com água fria, sabão neutro e passar com uma toalha suave", de seguida um quantidade enorme de cicalfate na cicatriz.
Para além da cicatriz tinha ainda de cuidar da hemorroidal. Claro que tinha de ter ficado com aquilo... Por isso, para além daquela rotina para a cicatriz, tinha ainda um bónus 3x ao dia de pomada para a hemorroidal.
A certa altura já nem sabia o que me doía mais: a cicatriz ou as hemorróidas.
Não só fazia estas limpezas todas como comecei também a fazer os Kegel. E com eles senti uma melhoria enorme, em tudo.
3 semanas depois do parto já estava quase como nova e decidi começar com caminhadas diárias. O que não durou muito tempo, porque veio uma onda de calor enorme e só ficava uma temperatura agradável às 22h00 e a essa hora não levava a miúda para a rua.
Quando tudo estava a encarrilar: menos dores, a amamentação menos mal, já conseguia andar, já não sangrava... O Duarte é operado ao tendão de Aquiles e tudo nesta casa cai em cima de mim.
"Tens de descansar", "Dorme quando ela dorme", "Tens de tratar de ti". Como? Impossível, entre um bebé recém-nascido e um marido que não pode andar, quem tinha de tratar da casa era eu. Quem tinha de acartar com as tralhas todas da bebé sempre que saíamos de casa era eu.
O cansaço já era tanto que chegou a um ponto em que eu já cometia erros parvos a conduzir. Não eram perigosos, eram erros de não me conseguir lembrar de caminhos que fazia há anos, de demorar eternidades a estacionar.
O que me valia é que a nossa bebé é uma santa. Tirando o não pegar bem na mama, não dá trabalho nenhum: dorme bem, alimenta-se em boas quantidades, não tem cólicas, é bem disposta.
Pronto: sofri com tudo, mas se a recompensa é ter uma sorte enorme na bebé que tenho e ela ser super saudável e feliz, isso vale a pena.
Oiço histórias de amigas e de mães em fóruns a dizer que os bebés não dormem, que acordam de hora a hora, que perdem peso, que têm cólicas. E eu sou penso "abençoada filha que me calhou."
Vale a pena todos os horrores do parto, dos pontos infectados, de todos os problemas nas mamas (feridas, bolhas, mastites, pus, etc etc), se tenho uma bebé que não sofre. Que é amada, que é feliz, que é saudável, que se está a desenvolver muito bem, que adere rapidamente às rotinas, que dorme...
Por ela, tudo vale a pena. Porque ela é a minha prioridade. Porque o meu dever enquanto mãe é protegê-la, adaptar-me às suas necessidades (por enquanto...), tudo.
A vinculação aconteceu. Não foi imediata, não foi com a amamentação (de todo!), foi com o cuidar dela. Foi com o brincar, com o limpar, com o falar. Foi com o dar colinho quando ela chora (não chora muito, mas chora). Foi com o perceber que ela me procura quando está com outras pessoas ou a brincar sozinha, mesmo que a seguir dirija a sua atenção para outra coisa. Foi com os sorrisos com que ela me presenteia todos os dias. Então os do acordar, são maravilhosos. Foi com o perceber que não há colo como o da mãe. Se ela começa a resmungar ou a chorar, mal vem para os meus braços tranquiliza. São os bracinhos dela à volta do meu pescoço a agarrar com força para que eu não a largue.
Todos os dias o amor cresce mais um bocadinho. Não veio com o parto, foi sendo construído. Não foi automático, mas já me apercebi que daria a minha vida por ela sem pensar. Agora já é o amor incondicional. É o amor da minha vida e agora percebo muitas coisas que dantes não percebia. Mas isso já é tema para outro artigo.
Agora que a minha história da gravidez e do parto está concluída, a minha ideia é ir partilhando convosco coisas como a linguagem dos bebés (sinais que eles dão de que estão com fome, sono, sobre-estimulados ou pouco estimulados), as sestas, o brincar, a importância das rotinas, como os habituar a adormecer/tranquilizar sozinhos, a amamentação, etc. Quero escrever também sobre a questão da vinculação, da amamentação, da depressão, etc.
Se houver algum assunto sobre o qual gostavam de ler, é só dizerem.
ADOREI!
ResponderEliminarObrigada, Sofia!!
EliminarJá agora, é a Sofia Carrêlo fisioterapeuta?
Beijinhos
Assim de repente e quase a ser mãe o meu coração ficou pequenino ao ler a sua história.
ResponderEliminarPergunto, porquê tanta hora, tanto sofrimento??
Isso é o que me assusta pois acho que uma mulher não deve nem nos dias de hoje ter a necesssidade de passar o que passou...a dada altura até me estava a parecer negligência médica.
Ainda bem que tudo correu bem e muitas felicidades ❤
Olá, Teresa :)
EliminarEu não considero que o meu caso seja negligência médica.
Acho que foram muitas horas por causa da indução, pelo que li é possível que a indução do parto resulte em partos mais longos e contracções mais dolorosas. Aí, sim, acho que os médicos não estiveram bem, apenas fizeram os procedimentos habituais. O meu plano não foi aprovado pela direcção hospitalar e eu também não pensei que me estivessem a fazer a indução.
O sofrimento... enfim... A epidural foi um azar, que pode acontecer, as dores no fim tiveram a ver com a posição em que a bebé se encontrava.
Acho que o que falhou mesmo foi a comunicação. Deviam-me ter avisado que me iam induzir o parto (antes da minha entrada nas urgências, ainda nas consultas) e quais as consequências do toque e descolamento de membranas; e, no final, deviam ter-me explicado porque não me davam o reforço da epidural (que deverá ter sido por saberem que no bloco me iriam dar ou por terem medo depois do que me tinha acontecido).
Depois e isto fica como dica: quando chegar a sua hora e tiver de ir para o hospital, exagere as dores, se for preciso. Chore, grite, o que precisar.
De todas as vezes em que fui parar às urgências, como tenho uma elevada tolerância à dor, o meu caso foi desvalorizado. É assim que eles funcionam. Porquê, não sei. Pelo sim, pelo não, mais vale dramatizar.
Mas vai ver que no seu caso, vai correr tudo bem. O meu foi um caso "anormal".
E, se voltasse atrás, não duvidaria em ter a minha bebé na MAC.